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Sábado, 20 de abril de 2024

AS LEMBRANÇAS DO VELHO CINEMA

01 de Out 2020 - 12h:17

A febre do “Titanic” acabou me dando uma grande vontade de ir ao cinema. Não, não vi o filme, não. Pelo que sei, ele está longe das telas jauenses e, a julgar pela marcha da carruagem, ainda vai demorar muito para aportar por aqui. Infelizmente, esta cidade centenária anda ruim de cinema e a coisa não vai melhorar tão cedo. Nem quando o Shopping Center entrar em funcionamento. Mas o intuito não é abordar as coisas sob esse prisma.

   É que esse sucesso do “Titanic” fez bater uma bruta saudade do tempo em que a gente podia escolher entre o Cine Jaú e o São Geraldo. Afinal, naquela época o cinema era uma das poucas, senão a única, opção de lazer possível. A outra era ficar em casa e ouvir rádio. Corria o ano de 1955, a cidade era pequena e a televisão era um sonho remoto. O Cine São Geraldo ficava ali, bem no centrinho, onde hoje está o prédio da Vivo. Era luxuoso, com poltronas estofadas e dois grandes ventiladores instalados ao lado da tela que faziam muito barulho, mas ninguém ligava. Tinha, também, uma das primeiras telas panorâmicas do interior, proporcionando uma visão ampla e era preciso sentar do meio da platéia para cima, para poder curtir a beleza do filme. A projeção era feita por dois aparelhos franceses, da marca Lorraine.

   No dia da inauguração não pude ir. Estava de castigo. Tinha ido mal na escola, tirado nota baixa. Estava com 12 anos e era vidrado em cinema, defeito que conservo até hoje. O primeiro filme que vi naquela baita telona foi “Natal branco”, um musical da Metro com Bing Crosby e Danny Kaye. O pessoal cantava o tempo todo, a historinha era banal, mas a emoção falava mais alto. No final, quando as coisas dava certo, o pessoal cantava “Natal branco” e, quando o “the end” aparecia, era hora de deixar a fantasia e partir para a realidade.

Cine São Geraldo

   O Cine São Geraldo reinou absoluto por muitos anos. Nos finais de semana, principalmente aos domingos, tinha três sessões: às 6, 8 e 10 da noite. O chic era a sessão das 8, com lugares numerados, entradas compradas com antecedência. As moças caprichavam no figurino e os rapazes chegavam a usar paletó e gravata. Coisas da época, mas que fazia uma grande diferença, inclusive no comportamento do pessoal. Foi ali, no São Geraldo, que eu vi a versão antiga do “Náufragos do Titanic”, uma película em preto e branco, da Fox, com Clifton Webb, Nina Foch e Gloria Grahame. Muitos chegavam a soluçar quando o navio afundava e os homens morriam cantando um hino de louvor a Deus.  

Cine Jahu

   Foi lá, também, no São Geraldo, que assisti a grandes produções, como os musicais “Sete noivas para sete irmãos” e “O rei e eu”, este, exibido numa espécie de festa que acontecia então e que se chamava “avant premiére”, ou seja, “primeira exibição”, com ingressos mais caros e entradas exclusivas para os mais ricos. Também foi naquela telona que vibrei com o drama “Carta de uma desconhecida”, uma suave e terna história de amor baseada num romance de Stephan Weig, onde o galã da época, Louis Jordan, personificando um pianista famoso, aprontava para cima de Joan Fontaine como uma mocinha romântica. Mas, foi também numa vesperal do São Geraldo, numa tarde fria que ganhei o primeiro beijo verdadeiro, adulto e sensível de uma senhorita que era uma simples colega de escola. Um dia o cinema se foi, demolido pela marcha do progresso. Ficaram apenas “as lembranças do velho cinema...”

Paulo Oscar Ferreira Schwarz

COLUNA PUBLICADA ORIGINALMENTE NO COMÉRCIO DO JAHU


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