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Quinta, 28 de março de 2024

AS HISTÓRIAS DOS LEITORES – 2

11 de Mar 2021 - 12h:25

A advogada e professora Maria Arlete Nassif Ortolani foi minha colega de faculdade, em Bauru, no final da década de sessenta. Sofremos juntos com outros companheiros por cinco anos, dentro do ônibus de número “50” da antiga Viação Jauense. Quando não entrava vento e chuva, fazia um calor danado, o que não impedia que todos fossem conversando sobre os mais variados temas. Outros cochilavam ou estudavam para as temidas provas, inclusive as orais no final do ano. Todos nós chegamos ao tão esperado cartucho que nos habilitou ao exercício da advocacia. Muitos ainda estão na ativa, alguns prestaram concurso para outras atividades. Poucos guardaram o diploma e seguiram em suas funções habituais. De tudo aquilo restou as ótimas amizades.

Pois bem, a Maria Arlete e eu conversávamos bastante sobre a figura do tio dela, o temido delegado doutor Emilio Mattar que deixou saudades e vários casos engraçados. Ele era enérgico, mas a situação jurídica do país era muito diferente. Não existia esse negócio de coitadinho, vítima do sistema.  Bandido era bandido e fim de papo. Além disso, havia um profundo respeito ao ordenamento jurídico e à lei e ordem. O “camburão”, ou seja, a única viatura policial da cidade era temida, assim como os poucos policiais existentes. As situações não tinham qualquer semelhança com a atualidade. Além disso, os limites municipais eram bem menores. O famoso “esteja preso” era fatal. Ninguém discordava. Nem mesmo o ilustre Leonardo Washington Tumulo Sobrinho escapou de uma boa bronca do delegado por estar na rua sem camisa. 

Pois bem, dia desses recebi, como presente, algumas narrativas sobre a ilustre figura jurídica. Este é um entre vários acontecimentos. Ela contou o seguinte: “... naquele tempo, ou seja, anos cinquenta, Tio Emilio era austero, não fazendo distinção entre pobre, rico, influente ou não. Para ele era o que deveria ser. Dizia que todos eram iguais perante a lei. Pois bem, certa vez acontecia na cidade um racionamento de energia entre vinte e vinte horas e trinta minutos, quando todas as luzes da cidade se apagavam. As residências inclusive. Tudo virava um breu, como se dizia. Era até possível sair de casa sem maiores problemas, pois violência e furtos eram coisas que só aconteciam em grandes cidades...”.

Mais adiante a doutora prossegue sua narrativa: “... Tio Emilio morava com tia Lorice Nassif defronte ao jardim de baixo, a sempre querida Praça da República. Logicamente os casais de namorados aproveitavam a cumplicidade do escuro para, digamos, um namorico mais arrojado. Não é que o Tio Emílio junto com um guarda ou o saudoso Guolo, iam com lanternas, de banco em banco, chamando a atenção dos apaixonados, principalmente daqueles que extravasavam um pouco nos carinhos, notadamente nos finais de semana. A bronca era grande, mas ele não perdoava ninguém...”. 

Ainda segundo a mestra Arlete: “... lembro-me também de um caso que ficou famoso na cidade, quando certo cidadão, político eminente, resolveu entrar a cavalo no então famoso Bar do Vinício. Chamado por outros frequentadores, tio Emilio não teve dúvidas, o personagem de destaque foi parar na delegacia para dar explicações. Se que seus argumentos conseguissem convencer ninguém. Tio Emilio era assim, íntegro. Em família o chamávamos por delegadão...”. 

Era ele, também, quem fazia os exames para os novos motoristas. Levava os jovens candidatos para a Rua 13 de Maio, exatamente naquele conhecido como “baixadão do Jahu Progride”. Pobre de quem permitisse que o veículo descesse alguns centímetros. E nada de usar o freio de mão. Foi exatamente ali que reprovou o hoje conhecido “motorista de praça” Wesley Ferreira Coelho, o popular Coelhinho que, aos dezoito anos, tentava obter sua primeira habilitação profissional. Tudo porque o carro desceu apenas um centímetro. Esses são apenas alguns dos causos que integram “as histórias dos leitores...”. 


P. Preto é jornalista - p.preto@hotmail.com

Texto publicado originalmente no Comércio do Jahu

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